Por Karina Alvarenga Ribeiro
Médica CRM - MG 40811
Endocrinologia e Metabologia
Especialização em Nutrologia
A mídia traz, diariamente e em ritmo frenético, pílulas novas, alimentação substituta, shakes e vários outros tratamentos que prometem a tão sonhada perda de peso. Entretanto, embora pareçam promover um sucesso inicial, estes tratamentos acabam fracassando e sendo substituídos por outros “novos e promissores milagres”.
É fato conhecido de todos que a obesidade é um problema sério de saúde pública. Em todo o mundo, existem cerca de 1 bilhão de pessoas acima do peso e 300 milhões de obesos. Em nível de Brasil, 40% da população está acima do peso e a obesidade infantil tem sido a maior preocupação dos especialistas na área. Pesquisadores de todos os países tem buscado encontrar um tratamento eficaz e definitivo para o problema.
Grande parte do insucesso nessa busca decorre do fato de frequentemente ignorarmos que a obesidade é uma doença multifatorial e necessita de abordagem interdisciplinar para a produção de resultados efetivos no tratamento.
A ideia de um tratamento prático e ágil para a obesidade e o sobrepeso já está arraigada na sociedade. Pude perceber isso nas mensagens de sugestões de temas para serem discutidos aqui. Vários e-mails solicitavam que eu escrevesse sobre “Metabolismo”.
As pessoas não desejam “emagrecer”. Não desejam informações sobre como podem elas mesmas conseguir sucesso no tratamento para perda de peso. Desejam “ser emagrecidas” sem esforço próprio com uma fórmula mágica, uma pílula mágica, uma massagem fantástica, uma máquina (lipo sem cortes) do futuro que trará o milagre do peso ideal e da forma corporal vendida na mídia. As pessoas esperam que eu dê uma solução para que o metabolismo se acelere e elas emagreçam.
Me rendi às sugestões. Afinal, para que servem os amigos? Vou discorrer sobre o assunto, mas vou partir de uma convicção de alguém que já perdeu 30 kg e até hoje mantém a vigília com a saúde – e não com a mídia.
Como começar um tratamento para perder peso?
A maioria dos colegas diria que o começo seria uma avaliação endocrinológica ou cardiológica, um teste ergométrico e exames de sangue (glicose, colesterol e tireoide). Todas estas medidas são importantíssimas e devem ser realizadas anualmente, mas no meu ponto de vista, o começo do tratamento deve ser uma boa avaliação psicológica.
Parece incoerente e sem sentido aos olhos de muitos, mas eu explico.
Independente do tratamento proposto, o mais importante é o grau de motivação do paciente. É isso que o leva a se engajar no tratamento, seja ele qual for. Acredito que os Psicólogos devem ser nossa linha de frente nessa avaliação, por vários motivos: experiência, qualificação, tempo com o paciente e tantos outros.
Um bom método para avaliar a motivação para a mudança é o chamado “método transteórico”. Esse modelo também é bem útil no decorrer do tratamento. Partindo dele, devemos saber por qual motivo o paciente vai em busca de tratamento, ou seja, qual sua motivação.
Motivação intrínseca – desejos, necessidades e metas da pessoa, como por exemplo, ter boa saúde, prevenir doenças, melhorar a condição física, dormir melhor, ter mais disposição, respirar melhor e até mesmo melhorar a autoestima. Estas são recompensas naturais da perda de peso.
Motivações extrínsecas – é uma resposta a recompensas ou punições sociais/ externas. Exemplo muito comum: emagrecer para casar ou para algum evento social. Outro mais comum ainda: “meu marido me traiu porque estou gorda”.
É preciso entender que apenas as motivações intrínsecas são preditoras de sucesso no tratamento. Os profissionais envolvidos nessa luta devem estimulá-las.
Para o modelo transteórico, a mudança ocorre ao longo do tempo passando por estágios bem caracterizados. Esse modelo foi estudado inicialmente por Prochaska e DiClementi (1982) e complementado por Toral e Slater (2007):
1. Estágio da Pré-contemplação: A pessoa não pretende mudar em um futuro próximo. Há resistência em reconhecer o problema ou pouca motivação para mudar o comportamento por falta de informações a respeito ou por tentativas anteriores frustradas. O paciente não reconhece as práticas alimentares inadequadas ou não tem a motivação necessária para alterá-las.
2. Estágio de Contemplação: Admite que tem um problema e começa a pensar em mudar, mas ainda não se compromete. Reconhece a necessidade e os benefícios da mudança, mas não se mobiliza. Faz uso de desculpas: “falta de tempo”, “preço alto”, “não estou pronto”, “não é a melhor época”, “o que os outros vão dizer...”.
3. Estágio de Decisão (preparação para a ação): São realizadas pequenas mudanças, mas não há persistência: “vou iniciar regime na próxima segunda”, “vou despedir para depois iniciar dieta”, “vou reservar finais de semana para família”, “só estava nervoso e não resisti à sobremesa”, “neste fim de semana vou ter três festas”, “tenho um filho que come doces e guloseimas” .
4. Estágio de Ação: As barreiras são superadas e atitudes são tomadas. Há modificações no comportamento, atitudes e padrões relacionais. O “objetivo” é encarado de frente e o esforço realizado de forma concreta. As mudanças já duram mais de seis meses. Redução na ingestão de alimentos gordurosos, prática regular de atividades físicas, contratação de um personal e principalmente a coragem para enfrentar o próprio Eu em uma terapia psicológica.
5. Estágio de Manutenção: Paciente realmente consegue incorporar na Vida o estilo de alimentação saudável e a realização de atividade física. O tratamento deixa de ser um peso, mas torna-se uma rotina prazerosa e compensatória. Tem padrão psíquico mais equilibrado, deixando de tratar a comida como drogas aliviadoras de tensões emocionais ou recompensas por um dia difícil ou pelo estresse.
Esses estágios refletem diferentes níveis de consciência do problema, de como o paciente vê a situação e seus diferentes graus de empenho para enfrentá-lo. É importante que um Psicólogo faça uma avaliação cuidadosa do paciente quando ele busca ajuda. Em que estágio (dos descritos acima) ele se encontra? A forma correta de ajuda-lo e a forma como reagirá ao tratamento pode variar muito, dependendo de em qual estágio ele está.
E isso é o que eu espero de um profissional de psicologia quando solicito acompanhamento de um paciente para perda de peso. Diagnosticá-lo e orientá-lo para auxiliar na superação das barreiras emocionais que o impedem de evoluir na busca de uma vida saudável.
Tratar a obesidade e perder peso é buscar o equilíbrio em todas as faces do ser: alimentação, atividade física, repouso e emoções. É descobrir o amor próprio. É ter coragem para enfrentar o EU verdadeiro e se posicionar diante do mundo, descobrir e assumir seu lugar. Emagrecer é simplesmente delicioso. Indescritível.